Platão e os outros sábios da antiguidade acreditavam que, para ter valor, a arte deveria conter e exibir as três irmãs: a Beleza, a Verdade e a Bondade, concebidas como intimamente interligadas: à semelhança da Trindade das religiões do mundo, as três qualidades, com efeito, eram aspectos diferentes do Supremo. Além disso, eram inseparáveis: uma obra de arte só seria bela se encerrasse em si elementos da Verdade e da Bondade. A arte que não contivesse tais elementos, era automaticamente feia, e deveria ser evitada. Definia-se a Beleza dizendo que ela continha a Verdade, no sentido de estar alinhada aos eternos princípios do Alto, e que continha a Bondade, visto que o seu efeito sobre o observador era sempre benéfico.
Entra agora em cena a “nova música”, para cujos proponentes a visão objetiva da arte – a saber, que ela afeta as pessoas e a sociedade – é maldição, pois exige do artista um senso de responsabilidade moral. Daí que, a fim de abrir caminho para a anarquia na música, a visão objetiva da arte precisa ser refutada; a inseparabilidade da Beleza, da Verdade e da Bondade precisa ser negada, de modo que possamos proclamar que a Beleza, ou valor artístico, não depende da Bondade, ou efeito objetivo, da obra.
Sejamos bem claros a respeito disso desde o começo. O sentido ou faculdade com que julgamos a música está num nível intelectual diferente daquele com que decidimos se uma ação ou instituição é boa ou má, ou se uma teoria científica, uma religião, ou um sistema filosófico é verdadeiro ou falso.
Dessa maneira, somos convidados a abraçar uma doutrina de estética em que não só a moral e a espiritualidade foram postas de lado por desnecessárias, mas também em que não subsistem padrões firmes, seja qual for a sua forma.
Segundo John Cage que foi um compositor, teórico musical, escritor e artista dos Estados Unidos e um pioneiro da música aleatória, da música eletroacústica, do uso de instrumentos não convencionais, bem como do uso não convencional de instrumentos convencionais, sendo considerado uma das figuras chave nas vanguardas artísticas do pós-guerra.
Os julgamentos de valor são destrutivos para o nosso negócio propriamente dito, que é a curiosidade e o conhecimento. Como usará você esta situação se você está lá? Essa é a questão.
Por que perdem vocês o seu e o meu tempo tentando fazer julgamentos de valor? Não sabem que, quando conseguem um julgamento de valor, não lhes resta outra coisa?
O músico contemporâneo, Christopher Small, está convencido de que, na música do século XX, enxergamos “a forma da sociedade a que ela aspira”. É uma sociedade com a qual podemos estar antecipadamente familiarizados através das obras de George Orwell e Aldous Huxley.
Num lado os antigos e tradicionalistas; a convicção de que a música afeta o caráter e a sociedade, e que, portanto, ao musico cabe a obrigação de ser responsavelmente moral e construtivo, e não imoral e destrutivo.
No outro os materialistas, repudiando a responsabilidade e a necessidade de julgamentos de valor, não dando atenção ao resultado dos seus sons. O segundo campo contém toda a massa de músicos mais populares e culturalmente significativos da atualidade.
Quem, então, está certo? Os padrões da vida seguem, ou não, os padrões da música?
Vamos lá
À pergunta: “A música afeta o corpo físico do homem?” a pesquisa moderna replica de maneira claramente afirmativa. É difícil encontrar uma única fração do corpo que não sofra a influência dos tons musicais. As raízes dos nervos auditivos estão mais amplamente distribuídas e possuem conexões mais extensas que as de quaisquer outros nervos do corpo (fato esse que pode ter profunda significação interior). Mostrou a investigação que a musica influi na digestão, nas secreções internas, na circulação, na nutrição e na respiração. Verificou-se que até as redes nervosas do cérebro são sensíveis aos princípios harmônicos.
O corpo é afetado de acordo com a natureza da música cujas vibrações incidem sobre ele .
Descobriram os pesquisadores que acordes consonantes e dissonantes, intervalos diferentes e outras características da música exercem todos um profundo efeito sobre o pulso e a respiração do homem – sobre a sua velocidade e a regularidade ou irregularidade do seu ritmo. A pressão sanguínea é abaixada pelos acordes ininterruptos e elevada pelos acordes secos, repetidos.
Constatou-se que a tensão da laringe sofre a influência de melodias, contraindo-se, por exemplo, durante uma série descendente de acordes. Como a laringe é muito sensivelmente influenciada pela corrente constante das emoções e dos processos mentais do homem, suas reações à música talvez indiquem o que é basicamente um efeito da música sobre a psique.
A música afeta o corpo de duas maneiras distintas:
– diretamente, como o efeito do som sobre as células e os órgãos,
– indiretamente, agindo sobre as emoções, que, depois, por seu turno, influenciam numerosos processos corporais. Como indica o efeito indireto dos tons sobre a laringe, as melodias provocam a ocorrência de uma longa história de tensões e relaxações em muitas partes do corpo.
Se o músico estiver tocando o seu instrumento, poder-se-á dizer também que ele está “tocando” o corpo e a mente do público.
Nos estudos em torno dos efeitos dos estímulos sonoros sobre os músculos do esqueleto, estudiosos descobriram que a música exerce poderosa influência sobre a atividade muscular, que aumenta ou diminui de acordo com o caráter das melodias empregadas.
Quando é triste ou o seu ritmo é lento, e em tom menor, a música diminui a capacidade de trabalho muscular a ponto de interrompê-lo de todo se o músculo estiver fatigado por um trabalho anterior.
A conclusão geral é que os sons são dinamogênicos ou de que a energia muscular aumenta com a intensidade e a altura dos estímulos sonoros. Constatou-se que tons isolados, escalas, motivos e simples sequências tonais exercem um efeito energizante sobre os músculos.
Outro efeito possível da música sobre o corpo é descrito por Bob Larson, antigo guitarrista de rock, que desistiu de tocar. Escreve Larson:
Os doutores Earl Flosdorf e Leslie A. Chambers descobriram, numa série de experiências, que sons agudos projetados num meio líquido coagulam proteínas. Em 1978 a mania dos adolescentes consistia em levar ovos frescos a concertos de rock e colocá-los à beira do palco. No meio do concerto, os ovos podiam ser comidos cozidos como um resultado da música. Surpreendentemente, poucos afeiçoados do rock perguntavam a si próprios o que a mesma música poderia causar-lhes aos corpos.
E já que falamos em música popular moderna e na grande ênfase que dá ao ritmo rápido, alto e sincopado, vale a pena lembrar que o ritmo da música exerce fortíssima influência sobre as batidas cardíacas, tendendo a ajustá-las, de certo modo, a si mesmo.
Síncopes musicais também se refletem em síncopes, ou ênfase desnatural, das pulsações do coração.
Verificou-se experimentalmente que os ritmos irregulares do jazz e do rock tiram das batidas do coração o seu ritmo perfeito. Revelou a pesquisa que a música de rock faz mal à digestão; é igualmente perigosa enquanto a pessoa está dirigindo automóvel. Além disso, uma vez que o rock eleva a pressão do sangue, é nocivo em casos de hipertensão preexistente.
E já que as pulsações cardíacas, por sua vez, afetam o estado de espírito e as emoções da pessoa, estes também sofrem a influência dos ritmos de rock, aumentando-se a tensão e a desarmonia do espírito. O ritmo, com efeito, nos atinge não só o corpo, a mente e as emoções, mas até o subconsciente. Quem já não terá percebido de repente que sua perna se move ao compasso de alguma música de fundo enquanto a mente consciente se acha inteiramente dirigida para outro lugar?
Chegou-se à conclusão de que os ritmos mais harmoniosos e saudáveis, conforme os seus tempos, são estimulantes ou sedativos eficacíssimos e, naturalmente, muito mais benéficos, a longo prazo, do que substâncias tóxicas, capazes de gerar dependência, como o Valium. Conta-nos Julius Portnoy:
A música pode, positivamente, modificar o metabolismo, afetar a energia muscular, elevar ou diminuir a pressão sanguínea e influir na digestão. E pode fazer todas essas coisas com maior sucesso e de maneira bem mais agradável do que quaisquer outros estimulantes capazes de produzir as mesmas alterações em nosso corpo.
O fato de o ritmo nos agitar ou acalmar parece depender, em primeiro lugar, da maneira com que a frequência de suas batidas se relaciona com a pulsação cardíaca normal de 65-80 batimentos por minuto. Um tempo que tenha, mais ou menos, um ritmo igual ao da pulsação cardíaca normal nos acalma, como se o nosso corpo pensasse consigo só: “Ah, está bem, estamos ambos em uníssono.”
De fato, se você levar a mão ao coração enquanto estiver ouvindo uma música assim, verificará que o coração tende rapidamente a corrigir qualquer discrepância do seu tempo, até atingir perfeita afinação com a música.
O ritmo mais lento do que a pulsação cardíaca, entretanto, gera tensão, como se o corpo se estivesse preparando para a súbita aceleração da cadência musical até a cadência normal do coração. (“A qualquer momento agora … a qualquer momento agora … “)
No extremo oposto da escala, os ritmos acelerados elevam o ritmo das pulsações do coração e, portanto, a excitação emocional. Qualquer pessoa pode pôr à prova esse fato, uma vez que não há nele nada de sutil.
Sentado em silêncio numa cadeira, como se estivesse ouvindo música de ritmo comum, conte o número de suas batidas cardíacas por um minuto. Depois, ligue o aparelho de som para tocar uma música rápida e, depois de um ou dois minutos, conte de novo as pulsações cardíacas por minuto.
O ritmo acelerado libera na corrente sanguínea substâncias químicas que excitam o organismo, pode dizer-se que essa música dá um “chute”. Quando uma pessoa jovem está acostumada a ouvir música rápida certo número de horas por dia, esses chutes se convertem literalmente numa forma de dependência, e o jovem experimenta uma sensação de vazio quando, por uma razão qualquer, não pode ouvir a música durante prolongado período de tempo.
Parece provável que o ritmo cardíaco dessas pessoas seja mais rápido que o de outras até durante o dia, mesmo que não estejam ouvindo a tal música. A ser assim, isso deveria ter graves implicações para a saúde física e emocional.
Em parte, o poderoso efeito produzido por ritmos diferentes sobre nós talvez seja determinado pelo primeiro ritmo que ouvimos, a saber, a pulsação cardíaca de nossa mãe. Numa experiência dirigida pelo Dr. Lee Salk, que foi um psicólogo infantil e autor americano a quem se atribui a descoberta do efeito calmante que o som dos batimentos cardíacos tem nos bebês, num berçário de hospital, tocou-se, para recém-nascidos, um disco em que haviam sido gravados os batimentos cardíacos normais. A maioria dos bebês acalmou-se e dormiu. Em seguida, o Dr. Salk fez ouvir a pulsação cardíaca acelerada de uma pessoa excitada. As duas gravações foram tocadas no mesmo volume mas, quando se tocou a segunda, todos os bebês despertaram, quase todos tensos e alguns chorando.
Um efeito insólito e menos comum da música é a doença da melodia conhecida pelo nome de epilepsia musicogênica. Algumas pessoas que a têm chegam a ponto de suicidar-se ou de matar. Cem casos casos dessa doença foram documentados, mas existem, sem dúvida, muitos outros pacientes que simplesmente não se dão conta da origem do problema e não receberam tratamento específico. Em cada caso documentado o paciente experimentou ataques provocados por certos tipos de música, embora a música causadora fosse diferente nos diferentes casos.
Um desses casos ocorreu com uma mulher britânica de 39 anos de idade que se sentia ansiosa e transpirava abundantemente sempre que se tocavam certas músicas em lugares como o supermercado ou o bar local. A princípio, ela não estabeleceu conexão entre a música e os sintomas. Só sabia que, nesses lugares, o raciocínio se anuviava, e os lábios, as pálpebras e os dedos se crispavam convulsivamente. Em seguida, perdia a consciência. Só com o passar do tempo veio a ligar os ataques à música de fundo. A mulher foi examinada pelos neurologistas Peter Newman e Michael Saunders, que tentaram produzir um ataque em condições controladas. Tentaram-se vários tipos de música, tais como música de Gilbert e Sullivan, o Messias de Handel e a Nona Sinfonia de Beethoven, mas sem nenhum resultado. Só quando tocaram uma musica dos Dooleys (É um grupo pop britânico masculino feminino composto em seu auge por oito membros – seis deles da família Dooley. O grupo alcançou vários sucessos nas paradas britânicas entre 1977 e 1981), intitulado “I Think I’m Gonna Fali in Love With You”, ocorreu o ataque. Mas se apenas 100 pessoas, segundo se constatou, vieram a sofrer de epilepsia musicogênica, o mesmo não se pode dizer de outros aspectos de alguns tipos de música.