
Bem, mas o que é Tantrismo?
Tantra significa ritual, teia, urdidura; a raiz da palavra Tan, que quer dizer “continuar”, “multiplicar”, tem o sentido também de “magico”, “esotérico.
O Tantra é um conjunto de livros e ensinamentos do Budismo Vajrayana (também chamado de mantrayana, tantrayana, budismo esotérico ou tântrico e Carruagem do Diamante é um conjunto de escolas budistas esotéricas. O nome vem do sânscrito e significa “veículo de diamante”. O vajrayana é às vezes considerado como uma extensão do budismo mahayana, uma vez que ele difere primariamente na adoção de técnicas adicionais (sânscrito: upāya, “meios hábeis”), ao invés de propor uma filosofia distintamente diferente. O mahayana possuiria assim dois caminhos de prática: o sutrayana, que prega o aperfeiçoamento através do acúmulo de mérito e sabedoria gradualmente, e o vajrayāna, que prega a tomada do fruto – a iluminação – como o caminho. Segundo a tradição budista vajrayana, os meios hábeis cultivados no vajrayana permitem ao praticante um caminho acelerado a iluminação. Para isto faz-se uso de técnicas tantra, que auxiliam o desenvolvimento espiritual e a transmissão esotérica. Nesta aceleração reside uma das diferenças entre a escola vajrayana e outras escolas do budismo. O budismo vajrayana, entretanto, não propõe que as escolas teravada ou mahayana estejam erradas, ao contrário, considera estas práticas como fundamentos essenciais sobre os quais a prática vajrayana pode ser construída.), e quatro são os Tantras Vajrayana:
1 – Krya – Tantra
Versam sobre rituais variados
2 – Carya – Tantra
3 – Yoga – Tantra
Versam sobre processos yoguicos
4 – Anuttara – Tantra
Muitos leigos acreditam que seja o Tantra de origem Hinduista, mas tal não é verdade.
A influência do Budismo Tantrico sobre o Hinduismo foi tão profunda, que até presentemente a maioria dos eruditos Ocidentais trabalham sob a impressão que o Tantrismo é uma citação hinduistica que foi retomada pelas Escolas Budistas posteriores, mais ou menos decadentes.
Contra este ponto de vista falam a grande antigüidade e o desenvolvimento consistente das tendências Tantricas no Budismo. Já anteriormente, os primitivos Mahasangikas ( sânscrito “da Grande Sangha”, foi uma das primeiras escolas budistas.) tinham uma coleção especial de fórmulas mantricas no seu Dharani-Pitaka (Conjunto cantos ou mantras budista que acredita-se que sejam protetores e com poderes para gerar mérito para o devoto budista), e os Manjusri-Mulakalpa (texto da classe Kriyā-tantra que contém rituais tântricos das mais diversas naturezas e finalidades), que de acordo com algumas autoridades remontam ao I sec. da era cristã, contem não somente mantras e dharanis, mas também numerosos mandalas e mudras. Mesmo se a data dos Manjusri-Mulakalpa é uma coisa incerta, parece provável que o sistema do Budismo Tantrico esta cristalizado numa forma definitiva no fim do 30 século D.C., como podemos ver no bem conhecido Tantra Guhyasamaja.( Tantra da Comunidade Secreta é uma das escrituras mais importantes do budismo tântrico. Na sua forma mais completa, consiste em dezessete capítulos prescreve como atuar como um guru e iniciar membros nas escrituras e mandalas).
Declarar o Budismo Tantrico como lançamento do Shivaismo (É o culto organizado do deus indiano Shiva que é reverenciado pelos seus seguidores como o Ser Supremo, que é tudo e que está em tudo, o criador, preservador, destruidor e revelador de tudo o que existe. É uma das principais formas de hinduísmo moderno e está espalhado por toda a Índia, Nepal e Sri Lanka, estando presente também em diversas partes da Ásia Meridional como a Malásia, Singapura e Indonésia) só é possível para os que não tem conhecimento em primeira mão da literatura Tantrica. Uma comparação dos Tantra Hindus com os do Budismo (que estão principalmente preservados em Tibetano e que por isto ficaram desconhecidos pelos Indologistas) mostra não somente uma assombrosa divergência de métodos e objetivos, apesar das suas semelhanças externas, mas também provam a prioridade histórica e espiritual e a originalidade dos Tantras Budistas.

Shiva
Sankaracharya, o grande filósofo Hindu do 9º Sec. D.C. cujos trabalhos formam o fundamento de toda a filosofia do Shivaismo, adotou as idéias de Nagarjuna ((século II) foi um filósofo budista da Índia que articulou a doutrina do vazio (sunyata) e é tradicionalmente considerado como o fundador da escola Madhyamaka, ou Escola do Caminho do Meio, uma escola budista Mahayana. Esta filosofia atribui grande importância às escrituras da prajnaparamita, ou as escrituras do aperfeiçoamento do conhecimento. Por vezes chama-se aos ensinamentos desta escola “O Segundo Movimento da Roda do Ensinamento“) e de seus seguidores em tão grande extensão que os hindus ortodoxos suspeitaram que ele era um devoto secreto do Budismo. De modo similar, os Tantras Hindus também assumiram o encargo dos métodos e princípios do Budismo Tantrico e os adaptaram aos seus próprios objetivos (tal como os Budistas tinham adaptado os antigos princípios e técnicas do yoga aos seus próprios sistemas de meditação). Este ponto de vista não é somente sustentado pela tradição Tibetana e confirmado pelo estudo de sua literatura, mas também foi verificado pelos eruditos Indianos depois de uma investigação critica dos mais antigos textos Sanscritos do Budismo Tantrico e do seu relacionamento histórico e ideológico como os Tantras Hindus.
Assim, Benoytosh Bhattacharyya (6 de janeiro de 1897, 22 de junho de 1964 em Calcutá), foi um estudioso indiano e especialista em história, teoria e prática do tantra budista.), no seu livro “Introduction to Buddhist Esoterim”, chegou à conclusão que:
“é possível declarar, sem receio de contradição, que os Budistas foram os primeiros e introduzir os Tantras na sua religião, e que os Hindus posteriormente os adotaram do Budistas, e que é fútil dizer que o Budismo posterior era conseqüência do Shivaismo.”
Um dos principais propagadores desta idéia errônea, que foi edificada sobre as semelhanças superficiais dos Tantras Hindus e Budista, foi Austin Waddell (Tenente-coronel Laurence Austine Waddell, CB, CIE, F.L.S., L.L.D, M.Ch., I.M.S. RAI, F.R.A.S (1854–1938) era um explorador britânico, professor de tibetano, professor de química e patologia, cirurgião do exército indiano, colecionador no Tibete e arqueólogo amador. Waddell também estudou sumério e sânscrito; ele fez várias traduções de selos e outras inscrições. Sua reputação como assiriologista ganhou pouco ou nenhum reconhecimento acadêmico e seus livros sobre a história da civilização causaram controvérsia. Algumas de suas publicações de livros, no entanto, eram populares entre o público, e hoje ele é considerado por alguns um precursor da vida real do personagem fictício Indiana Jones.), que freqüentemente é mencionado como uma autoridade no Budismo Tibetano. Em sua opinião, o Budismo Tantrico nada mais é do que “idolatria shivaista, adoração a shakti e demonologia”. Seus “tão chamados mantras e dharanis” são “palavras sem sentido”, “seu misticismo uma pantomina tola de um jargão sem significado e “ círculos mágicos”, e seu Yoga um “parasita cuja monstruosa excrescência esmagou e corroeu a maior parte da pequena reserva de pureza da vida Budista ainda existente no Mahayana. “A doutrina Madhyamoka era essencialmente um niilismo sofisticado; “o Kala-Chakra ( o mais antigo dos Tantra) sem valor para ser considerado como filosófico”.
Como foi principalmente de tais “autoridades” que o Ocidente obteve suas primeiras informações do Budismo Tibetano, não é de admirar que até presentemente numerosos preconceitos contra o Budismo Tantrico estão firmemente entrincheirados na mente Ocidental, como na mente daqueles que se aproximaram do assunto através da literatura Ocidental.
Julgar os ensinamentos e símbolos do Budismo Tantrico sob o ponto de vista do Tantra Hindu, e especialmente dos principio do Shaktismo (“doutrina do poder” ou “doutrina da Deusa”) é uma denominação do Hinduísmo que concentra a sua adoração em Parvati – a Divina Mãe hindu, assim como suas várias manifestações, como Durga e Kali, e outras deusas como Lakshmi e Sarasvati, consideradas formas diferentes da mesma Divindade. Juntamente com o Shivaísmo e o Vaishnavismo, faz parte das primeiras escolas do Hinduísmo.
Os adeptos do Shaktismo vêem Devī (lit., ” a Deusa”) como o próprio Brahman Supremo, “o único”, e considerando todas as outras formas de divindade, femininas ou masculinas, como meras manifestações.
Em relação à sua filosofia e prática em particular, o Shaktismo lembra o Shivaísmo. No entanto, os praticantes Shakta (Sanskrit: Śākta, शाक्त), do Shaktismo, concentram a grande parte da sua devoção a Shakti, que representa a energia ou poder; e Prakriti, que significa matéria, ambos aspectos femininos da Divindade na visão do Shaktismo. Shiva, o lado masculino da divindade, é considerado exclusivamente transcendente, representando o conceito de Purusha (que significa Espírito) e a sua adoração tem um papel de apoio.
As raízes do Shaktismo têm origem na Índia pré-histórica. Desde a primeira imagem conhecida da Deusa no paleolítico, há mais de 22.000 anos, até ao aperfeiçoamento do seu culto na Civilização do Vale do Indo, passando por um obscurecimento parcial durante o período védico, e posterior rejuvenescimento e expansão na tradição sânscrita clássica, tem sido sugerido que, de muitas formas, “a história da tradição hindu pode ser vista como um reaparecimento do feminino.”), não somente é inadequado como completamente enganador, porque ambos os sistemas partem de premissas inteiramente diferentes. Não podemos declarar o Budismo ser idêntico ao Bramanismo só porque ambos fazem uso dos métodos Yoga e de termos, técnicas e filosóficas similares, nem tampouco é permitido interpretar os Tantras Budistas luz dos Tantras Hindus e vice-versa. Ninguém, poderia acusar o Budha de corromper sua doutrina pela aceitação dos deuses da mitologia Hindu como pano de fundo dos seus ensinamentos ou utilizá-los como símbolos de determinadas forças ou experiências de meditação, ou como expoentes dos mais altos estados da consciência – porém, se os Tantras seguem um caminho similar, eles são acusados der serem corruptores do Budismo genuíno.
É impossível compreender qualquer movimento religioso, a menos que nos aproximemos dele com um espirito de humildade e respeito, que é o caráter de todos os grandes eruditos e pioneiros do estudo. Por isso, nós temos que observar as diferentes formas de expressão nas suas conexões genéticas e contra o pano de fundo espiritual donde elas evoluíram no seu sistema particular, antes de começar a compará-los com características semelhantes dos outros sistemas. De fato, muitas coisas que aparecem semelhantes na superfície são muitas vezes justamente aquelas nas quais os sistemas diferem fundamentalmente. O mesmo passo que nunca conexão os leva para cima, pode nos levar para baixo em outra conexão. Por conseguinte, derivações fisiológicas e comparações iconográficas, ainda que possam ser valiosas em outros aspectos, não são adequadas aqui.
O desenvolvimento no Tantra feito pelos Budistas e a extraordinária plástica desenvolvida por eles não deixou de criar também uma impressão na mente dos Hindus, que prontamente incorporaram muitas idéias, doutrinas, práticas e deuses, originalmente concebidas pelos Budistas para a sua religião. A literatura, que se segue pelo nome de Tantras Hindus, surgiu quase imediatamente depois que as idéias Budistas tinham se estabelecido.
No fim das suas convincentes provas históricas, literárias e iconográficas, que substanciam o que é evidente a todo estudante do Tantra Budista e da tradição Tibetana, Bhattacharya conclui:
“Está assim amplamente provado que o Tantra Budista influenciou grandemente a literatura Tantrica Hindu, e por isso, é incorreto dizer que o Budismo era uma conseqüência do Shivaismo. Isto é, sustentar, de outro modo, que os Tantras Hindus eram uma conseqüência do Vajrayana, e que eles representam imitações de pouco valia dos Tantras Budistas.”
Por isso, estamos plenamente de acordo com Bhattacharya quando diz:
“As aparências exteriores dos Tantras Budistas parecem-se num grau muito acentuado com os dos Tantras Hindus, mas na realidade há uma muita pequena semelhança entre eles, tanto na matéria subjetiva ou nas doutrinas filosóficas inculcadas neles, ou nos principio religiosos. Isto não é para ser admirado, desde que os objetos e objeções dos Budistas são grandemente diferentes daqueles dos Hindus“.
A principal diferença é que o Budismo Tantrico não é Shivaismo. O conceito de Shakti, do poder divino, dos aspectos criativo feminino do supremo Deus (Shiva) ou de suas emanações não desempenham nenhum papel no Budismo. Enquanto que nos Tantras Hindus o conceito de poder (Shakti) forma o foco de interesse; a idéias central do Budismo Tantrico é prajna conhecimento, sabedoria.
Para o Budista, Shakti é Maya, a própria força que cria ilusões da qual somente a sabedoria Prajna pode nos libertar. Por isso, o objetivo do Budista não é adquirir forças, ou se unir às forças do universo, nem se tornar seu instrumento ou tornar-se seu senhor, mas pelo contrario, ele tenta se libertar daquelas forças, que desde a eternidade o mantém prisioneiro do sansara. Ele se esforça para perceber essas forças que o tem mantido no ciclo da vida e da morte, de modo a se libertar dos seus domínios. No entanto, não tenta negá-las ou destrui-las, porém transformá-las em fogo de conhecimento, de modo que elas possam se transformar em forças de Iluminação que, em vez de criar discriminações adicionais, fluem na direção oposta: para a união, para a totalidade, para a plenitude.
A atitude dos Tantras Hindus é completamente diferente, se não oposta. “Unido com Shakti, sé tu cheio de poder”, diz o Tantra Kulacudamani (“Jóia da crista” da divisão Kulachara de Tantrika Sadhakas está incluído na lista de obras reveladas, que segundo o Vamakeshvara Tantra, são consideradas as principais dentre as que lidam com o culto a Shakti. Por isso, é freqüentemente encontrado como autoridade em muitas compilações, embora o próprio Kulachudamani (II, 8) nos remeta, para todos os termos técnicos, ao Tantra Bhairavi, que é, no entanto, agora conhecido principalmente por citações feitas a partir dele. Como todos os trabalhos originais sobre a adoração ao Tantrika, o Kulachudamani é lançado na forma de um diálogo, o Shastra sendo revelado pelos Devi em Sua forma como Bhairavi, em resposta a perguntas colocadas a ela por Shiva em Sua forma como Bhairava. Por essa razão, o livro está incluído na classe que leva o nome de Nigama, em oposição a Agama, na qual o shastra é revelado pelo próprio Shiva. A forma na qual um Shastra se apresenta como Revelação de Shiva ou Shakti é mera Lila. Siince Shiva e Shakti são a mesma coisa e é Shiva quem revela; Shiva é o revelador dos Shastra em todos os casos, embora em alguns Ele figura como Shishya e em outros como Guru) “Da união de Shiva e Shakti o mundo é criado.” O Budista, no entanto, não deseja a criação e expansão do mundo porém o caminho de volta para o “incriado, não formado”, ao estado de sunyata, do qual toda a criação procede, ou daquilo que antecede e está além de toda criação (se fosse possível descrever o inexpressável na linguagem humana).
Estar consciente deste sunyata é prajna: o mais alto conhecimento. A realização deste mais alto conhecimento na vida é a Iluminação, isto é, se prajna (ou sunyata), o principio feminino passivo que tudo envolve, do qual todas as coisas procedem e ao qual todas as coisa regressam, está unido ao principio dinâmico masculino do amor universal ativo e compaixão, que representam os meios (upaya) para a realização do prajna e sunyata, então o perfeito Estado Buddhico é alcançado. Porque o intelecto sem o sentimento, o conhecimento sem o amor e a razão sem a compaixão levam à negação pura, à rigidez, à morte espiritual, à mera vacuidade – enquanto o sentimento sem a razão, o amor sem o conhecimento (amor cego) e a compaixão sem a compreensão levam à confusão e dissolução. Porém, quando os dois lados estão unidos, quando se der o grande síntese da cabeça e do coração, do sentimento e do intelecto do amor mais elevado e do mais profundo conhecimento, então o perfeito é restabelecida, a perfeita Iluminação é alcançada.
O processo de Iluminação é, por isso, representado pelo mais obvio, o mais humano e ao mesmo tempo o mais universal símbolo imaginável: a união do macho e da fêmea no êxtase do amor – no qual o elemento ativo (upaya) e representado pelo masculino e o passivo (prajna) pela figura feminina – em contraste com os Tantras Hindus, onde o aspecto feminino é representado como Shakti, isto é, como o principio ativo, e o aspecto masculino como Shiva, como o estado puro da divina consciência do “ser”, a saber, como o principio passivo, o “repouso na sua própria natureza.”
No simbolismo Budista, o Conhecedor (Buddha) torna-se uno com seu conhecimento (prajna), tal como o homem e a mulher estão unos nos braços do amor, e este torna-se uno é a mais alta, indescritível felicidade (mahasukha). Os Dhyani-Buddhas (isto é os Budhas ideais visualizados na meditação. Dhyani-Buda é um termo composto sânscrito de dhyāni (“contemplativo, aquele que medita”) e buda (um “desperto” ou “o iluminado”), que pode ser traduzido como “Buda da Contemplação” . No budismo Vajrayana, existem cinco Dhyani-Budas, a saber Akobobya, Amitabha, Amoghasiddhi, Ratnasabhava e Vairocana.Os cinco Dhyani-Budas são baseados nos ensinamentos Yogācāra sobre a doutrina Trikaya (sânscrito Tri: “três” e kaya: “corpo”), que postula três “corpos” do Buda. Os Dhyani-Budas são todos os aspectos do dharmakaya ou “corpo da verdade”, que encarna o princípio da iluminação.) e Dhyani Bodhisatvas como personificações do impulso ativo da iluminação, que encontram sua expressão em upaya, a compaixão e amor que tudo envolve, são por esta razão representados no amplexo de sua Prajna, simbolizada por uma deidade feminina, a personificação do mais alto conhecimento.
Isto não é o reverso arbitrário da simbologia Hindu, na qual “os pólos masculino e feminino como símbolos do divino e da sua expansão tiveram que ser evidentemente trocados, porque de outro modo o gênero dos conceitos que eles intencionavam personificar no Budismo não estaria em harmonia com eles”, mas sim, a aplicação conseqüente de um princípio que é de importância fundamental para o sistema Tantrico Budista inteiro.
De maneira similar, os Tantras Hindus são igualmente ma aplicação compatível com as idéias fundamentais do Hinduismo, ainda que eles tomaram para si o encargo dos métodos Budistas, onde convinha a seu propósito. Porém, o mesmo método, quando aplicado por dois pontos de vista opostos, logicamente deve conduzir a resultados opostos. Não é necessário recorrer a razões tão superficiais como da necessidade de obedecer ao gênero gramatical de prajna (feminino) e upaya (masculino).
Tal premissa foi somente a conseqüência da pressuposição da errada que os Tantra Budistas eram uma imitação dos Tantras Hindus, e o quanto mais cedo pudermos nos livrar deste preconceito, mais claro se tornará que o conceito de Shakti não tem lugar no Budismo.
Tal como o Theravadin ficaria chocado se o termo anatta fosse trocado por seu oposto e traduzido pelo termo bramanico Atman ou seria explicado de tal maneira que os Theravadins aceitassem a idéia do Atman (desde que Budismo era somente uma variação do Bramanismo!), assim o Budista Tibetano ficaria chocado com a interpretação errônea da sua tradição religiosa com o termo Hindu shakti, que nunca é empregado nas suas escrituras e que significa exatamente o quarto do que ele quer expressar com o termo prajna ou com a forma feminina oposta dos Dhyani-Buddhas e Bodhisatvas.
Não se pode transplantar arbitrariamente termos de um sistema teísta, em cujo centro está a idéia de um Deus Criador, num sistema não teista, que enfática e fundamentalmente nega a idéia de um Deus Criador. De uma tal confusão de terminologia surge finalmente a idéia errônea que o Adibuddha de Tantras anteriores nada mais é do que outra versão do Deus Criador, que seria uma completa reversão do ponto de vista Budista. O Adibuddha, entretanto, é o símbolo da universalidade, da temporalidade e da plenitude da mente iluminada, ou como Guenther exprime mais vigorosamente: “a afirmação que o universo ou o homem é o Adibuddha não é senão uma verbalização inadequada de uma experiência compreendida totalmente. O Adibuddha seguramente não é um Deus que, como passatempo, joga dados com o mundo. Ele não é tão pouco uma espécie de monoteísmo sobreposto num Budismo primitivo, presumivelmente ateísta. Tais rações são os erros de semânticos profissionais. O budismo não tem inclinação para teorização. Ele esforça-se para penetrar nas profundezas secretas do mais intimo do nosso ser e fazer a luz oculta brilhar com todo fulgor. Deste modo, o Adibuddha é melhor traduzido como expansão da verdadeira natureza do homem.
Como em todas as escolas, muitos detalhes essências só são transmitidos de boca a ouvido, quando o chela (discípulo) está devidamente apto a receber o ensinamento e colocá-lo em prática. O Tantrismo, além de estar ligado ao Budismo Tibetano e outras formas de Budismo como o Shigon, é praticado também por um grupo de seitas Shivaistas, como vimos.
Existem cinco grupos tantricos na Índia. Tais grupos não são de fácil penetração, pois suas doutrinas são evidentemente esotéricas; porém mesmo na Índia existem deturpações, e grupos que praticam o lado negro da magia, de fato existem.
Como se vê, é preciso discernimento em grande quantidade. Ademais o Budismo Tibetano, que é nossa linha de trabalho e o Shigon são, para quem se dispõe a dedicar a vida, excelentes caminhos tantricos. Existem escolas dos dois grupos no ocidente mas não há, evidentemente praticas para darem vazão a imaginação erótica de quem procura pseudo tantra.
Agora continuando nosso tema principal. O Yoga Sutras de Patanjali é um texto clássico do Yoga. Ele nos fala dos 18 estágios dessa disciplina. São como que degraus através dos quais o discípulo pode aspirar aquele encontro com o seu verdadeiro Ser: O Samadhi. A meditação é o próprio caminho que permite a realização desse encontro. Os homens estão em vários estágios de desenvolvimento. A escala na visão tantrica vai desde o Paçu, o homem mecânico, até o Dyvia, o liberto. A meditação é adequada a todos eles. É uma técnica na qual se procura através de recursos físicos ou psíquicos, atingir aquele momento em que o “eu” cessa e se da a percepção do Real. São inúmeros os caminhos para o mundo interior. No Oriente, temos uma verdadeira constelação de valores onde as principais estrelas são a Índia, a China, a Ásia Central e sudeste da Ásia e o Japão.
A finalidade de todas elas é a libertação do sofrimento, a paz, a integração com o todo. A libertação do dualismo, do processo do vir a ser, que obriga a uma série quase infinita de mortes e renascimentos na busca da perfeição. Na Índia, esse processo é chamado de SAMSARA (vir a ser) ou LILA (jogo). A paz indicada como meta, por todas as Escolas, leva a uma participação intensa, ao êxtase, ao gozo místico. Ao “orgasmo” supremo onde se dá a cessação do eu e do tu. Os hindus, na Escola de Filosofia do Yoga, estudam os métodos para atingir os objetivos mencionados. A meditação é um dos últimos degraus nessa escala ascendente que leva a contemplação do Real. A seqüência é a concentração, meditação e contemplação, como já sabemos, o desenvolvimento da plena atenção é enfatizado como um método de ampliação do foco, normalmente, nossa atuação é difusa. Estamos sendo chamados através dos estímulos sensoriais, para o percebimento de aspectos relativos da realidade.
A grande maioria dos seres humanos é desatenta. A plena atenção pressupõe três fases:
10) pré-seleção;
20) seleção; e
30) ajustamento.
Na primeira, dá-se a fixação do campo a observar; na segunda, a escolha do objeto a observar; e, por fim o aprofundamento nesse objeto graças a uma focalização que se adquire pela prática.
A atenção subtende um observador, uma coisa observada, uma ligação entre ambos é uma imagem refletida. Ma maioria dos casos, a imagem refletida é completamente diferente da coisa observada. Normalmente, só captamos alguns aspectos superficiais dela. A imagem é pois, uma representação insuficiente, sem nitidez. Para isso, temos que aumentar a sensibilidade do “filme”, como se faz numa fotografia, iluminar melhor o objeto, focar com maior precisão. Å medida que aumentamos o grau de nossa atenção, vai sendo revelado uma admirável mundo novo antes desconhecido. A meditação é , pois, uma “porta” de entrada o desconhecido. Ela pode ser focalizada em quatro planos:
1 – No corpo
2 – Nas sensações
3 – Nos pensamentos
4 – Nos objetivos da mente
A focalização no corpo pressupõe:
a – Atenção visual: forma, cor e textura.
Na atenção à forma, destacam-se a proporção, a beleza e a harmonia. No caso da cor, temos a considerar a tonalidade, a intensidade e o brilho. Quanto à textura, há vários graus que vão desde a rústica até a lisa.
b – Atenção auditiva: tonalidade, altura e timbre.
c – Atenção olfativa: agradável, (perfumada), inodora desagradável.
d – Atenção gustativa: doce, insossa, amarga, picante adstringente, ácida.
e – Atenção tátil: áspera, macia, neutra.
A focalização nas sensações vai desde a agradável à neutra e à desagradável em vários graus. Há uma imensa escala de valores que vão desde o prazer mais intenso à dor mais perfurante.
A atenção nos pensamentos cobre toda uma gama que se estende dos mais diferentes pensamentos representativos de objetos concretos até uma infinidade de pensamentos abstratos.
A atenção aos objetos da mente está dirigida aos conceitos que povoam a nossa mente.
Existe, pois, toda uma série de “linguagens” diferentes ligadas aos campos mencionados, muitas vezes com seus “dialetos” e “chaves” que são desconhecidos para a maioria. Vamos analisar algumas “chaves” do mundo da forma. A forma é uma “presença” com o seu volume, peso, equilíbrio. É energia concentrada no espaço e no tempo. Dai nasceu o conceito da Arquitetura, onde as formas, com seus pesos, proporções e equilíbrio são exploradas ao máximo, como sendo uma verdadeira música congelada. Quando essa forma é a de um círculo, temos o símbolo vivo da limitação do espaço de um campo de força, que se propala de um centro que representa o “ser” em direção à circunferência que nasce no limite do “não ser”. É, também, algo correlacionado com a Consciência e a Inconsciência. A circunferência é o eterno sem principio nem fim, simbolizado pelos gregos no Uroboros – a serpente que morde a Própria cauda. É também, o zero; o vazio: Sunyata, a Plenitude; o ventre materno, etc.
Vejamos o que nos fala, na sua “linguagem”, uma flor. Uma flor é um processo de desenvolvimento, de algo em expansão até a abertura total. Enquanto fechada, num botão, é a imagem viva de tensão. A flor aberta é a distensão, a plenitude. A flor, sob a forma de um lótus, de uma rosa ou de um lírio, é mentalizada na meditação como estando situada no coração. A plena realização se dá quando todas as pétalas estão aberta.
Os elementos fundamentais da Natureza – terra, água, ar, fogo e éter, na tradição hindu – estão simbolicamente correlacionados a uma série de conceitos.
1. A terra (Prithivi) é o denso, o esperado, o estável. Sua característica fundamental é a inércia. Representa a longevidade, a escuridão, as trevas, as correntes, a permanência. Sua cor é marrom. Sua forma simbólica é um quadrado e o cubo. Seus elementos destruidores são o calor, o raio, a água e o vento. Para ser desintegrada, é necessário a presença do impacto, do sofrimento. A terra é o máximo da tensão.
2. A água (Apas) é o fluído, o circulo, a esfera, a gota, o instável. Sua tônica é a mobilidade. Simboliza as emoções, as sensações, os choques.
3. O fogo (Agni) é a destruição, a renovação, o calor, a luz. O dissolver das estruturas. Ele purifica, refina, tempera. Seu símbolo é o triângulo ou a pirâmide. É a intuição, a ascensão. Sua cor é o vermelho.
4. O ar (Vayu) é a leveza, a invisibilidade, as idéias. Bolhas flutuando no espaço, onde se manifestam no plano mental as formas pensamento. Há uma aura mental com cores, contornos, graus de nitidez e permanência.
5. O éter (Akasha) é a consciência, o local onde está o centro reflexivo da existência (Atma, Monada ou Espirito). É o território ultimo (Tat), o divino, a raiz das coisas.
Outro símbolo muito utilizado na meditação é o coração. Representa o âmago, a essência, o mistério supremo. Nele surgem as chamas simbólicas da Sabedoria (Prajna) ou os espinhos da Compaixão (Karuna).
A cruz simboliza o encontro de dois mundos. O braço horizontal é o tempo, a continuidade. O braço vertical é um corte nesse processo; e identificado com a eternidade. Alguma coisa que vem de cima e nos transfixa o coração. O centro, o ponto de encontro é o “aqui agora”, a mágica junção do tempo e do espaço.
Esses poucos exemplos são apenas uma demonstração da imensa potencialidade contida num símbolo. As diversas “linguagens” com que ele se expressa para quem está atento.
Passemos ao exame de algumas “chaves”.
1. As Chaves da Cor
O espectro luminoso com suas sete cores, onde três são fundamentais: o vermelho, o amarelo e o azul. As sete nascem de três. Há uma linguagem luminosa correlacionando as cores e as emoções a centros de força. Há, hoje, uma Escola Cromoterápica que adota a medicina das cores na cura de neuroses e no alívio de psicoses. O Tantra identifica cada divindade, deve ou ser com uma cor básica.
2. As Chaves do Som
Diz o pensador chinês Chuang-Tzu: “A verdadeira indiferença não é o indiferente. Quanto mais o indivíduo estiver apto a remover o seu pequeno Ego (inclusive as idéias a respeito do moral) do curso da sua natureza profunda, mais cheia de beleza e bondade será a música executada pelos deuses através desse bambu-oco”. Nós somos esse “bambu-oco”. Se não estivermos vazios, ocos, nunca seremos segurados (tocados). Pelos deuses. São eles que executam em nós as suas músicas. Continua Chuang-Tzu: “A música da terra canta através de milhares de furos. A música do homem é feita de flautas e instrumentos. Mas, quem faz a música dos céus?”
“Alguém está soprando em milhares de furos diferentes. Um pode está por trás e faz que o som nasça e morra. Que poder é esse?”
Na concepção tantrica, o Mantra é um instrumento (TRA) do pensamento (MAN). É força, poder. Cada divindade (força natural) está ligada a um som ou a um conjunto de sons. Nos rituais tantricos, utilizam-se as chaves das correlações entre os sons, cores e formas com propósitos definidos.
3. As Chaves do Gesto
Os mudras são posturas simbólicas das mãos impregnadas de poder. Há força nos gestos. Há poder num Mudra. Os efeitos do Mudra são produzidos pela energia que é emitida por cada dedo, que tem características vibratórias diferentes. As inúmeras posições possíveis num Mudra isolado (feito por uma só mão) ou dos Mudras resultantes da combinação de ambos, geram campos de força com características diferentes. Produzem “sons”, que podem ser ouvidos pelos que têm a devida sensibilidade.
As energias da cada dedo são:
Mínimo – terra; anelar – água; médio – fogo; indicador – ar; e polegar – éter.

Pratica 1 de Meditação – Relaxamento
4. As Chaves da Ação Corporal
A dança é a transposição da impressão e uma expressão. É o efeito de uma mola que liberta a sua tensão nos gestos. A liberação dessa energia cósmica, que está em nós, pode ser feita sem esforços. Os dervixes dançarinos, o Tai Chi chinês, os movimentos feitos em grupo ou isoladamente podem conter essa ação liberatória e propagar para o mundo as silenciosas vibrações da harmonia universal. A conotação sacra da danças está na sua origem. Na tradição hindu, a dança é uma Sadhana (uma prática) que poderá levar o homem até Deus. A presença de bailarinas nos templos da antigüidade é um testemunho da sacralidade da ação correta.
A meditação é um oceano que se abre a medida que o homem vai adquirindo a técnica necessária para mergulhos mais profundos em si mesmo. Inúmeras são as técnicas à disposição dos verdadeiros praticantes.
Cláudio Naranjo ( (Valparaíso, 24 de novembro de 1932 – Berkeley, 11 de julho de 2019) foi um médico psiquiatra e músico chileno. Com sólida formação em música, abandonou o piano e a composição ao entrar na universidade.) e Ornstein (Robert Evan Ornstein (21 de agosto de 1942 – 20 de dezembro de 2018)foi um psicólogo, pesquisador e autor norte-americano. Lecionou no Instituto Neuropsiquiátrico Langley Porter, com sede no Centro Médico da Universidade da Califórnia em São Francisco, e foi professor na Universidade de Stanford e fundador e presidente do Instituto para o Estudo do Conhecimento Humano (ISHK).), no livro On Psychology of Meditation, dizem:
“Minha exploração nos terrenos da meditação mostra que a essência da meditação e idêntica à da Arte, à da Religião, à da Magia e à da Psicoterapia. Assim como à essência de fazer qualquer coisa na atitude correta. Acredito que para quem medita com a compreensão correta toda a vida é meditação. E meditação é vida.”
Os efeitos da meditação são perfeitamente visíveis. Podem ser acompanhados em laboratório, sob controles rígidos, as modificações significativas de traçados e ritmos cardíacos, respiratórios, cerebrais, etc.
Antes de começar a descrever as diferentes fases e os vários tipos de meditação, e preciso determo-nos sobre algumas considerações de caráter geral, que nos poderão ajudar a compreender mais claramente qual a verdadeira essência desta pratica e qual a sua importância.
Ao iniciar o trabalho de meditação, verificam-se gradativamente algumas claras mudanças em nossa vida, pois, sem o percebermos claramente, ao meditar, dirigimos nossas energia psíquicas para um novo horizonte, e isso produz efeitos e transformações em nossa personalidade. Um destes efeitos é o aparecimento da exigência de purificação e de auto-formação juntamente com um claro e premente impulso de crescimento e de aperfeiçoamento.
Mesmo dedicando a meditação apenas meia hora da manhã cedo, obtém-se um certo resultado, porque a duração de meditação não é importante; o que interessa é a “qualidade” e a “correta atitude da consciência” em relação a ela. Se esses dois requisitos estiverem presentes, qualquer que seja o tempo dedicado a pratica produzisse-a no decorrer da meditação uma abertura para os níveis super-conscientes de nós mesmos, com conseqüente afluxo de energias espirituais nos veículos que tendem para objetivos bem explícitos. No decorrer do dia, essas energias são absorvidas pela personalidade e começa então um lento e gradual processo de transformação e de purificação do indivíduo.
Se tal resultado não se manifestar, isso significa que a meditação foi feita somente como uma técnica mecânica exterior, e não produz nenhuma abertura para as energias do Eu Superior.
A verdadeira meditação abre uma porta para uma dimensão mais alta do que a habitual e constrói uma ponte, conforme já dissemos, para o polo mais profundo de nós mesmos. Por, isso, quando decidimos iniciar um trabalho de meditação, tacitamente decidimos nos transformar e modificar nossa vida. Mais cedo ou mais tarde, teremos de perceber que a meditação, após um determinado período de tempo de pratica regular, estimula a ativa até mesmo parte do cérebro até então adormecidos despertando aspectos superiores de nós mesmos ainda latentes e não manifestados. Na realidade, a meditação é uma abertura para o super-consciente e faz aflorar todas as qualidades e faculdades mais nobres, mais elevadas do homem, que representam sua natureza intrínseca e autentica. Por isso, devemos nos aproximar da meditação com seriedade e consciência do seu verdadeiro valor e significado.
A meditação tem inicio com a interiorização, isto é, com a abstração da atenção do mundo exterior e dos objetos (pratiahara); por isso, aconselha-se fechar os olhos ao meditar. Porém, não é suficiente “não enxergar” com os olhos o mundo exterior, é preciso esquecê-lo, abstrair-se completamente dele, para poder perceber a dimensão interior, a realidade do mundo subjetivo.
Para quem está no inicio dessa pratica, a dimensão interior constitui-se basicamente do conteúdos psicológicos (emoções, pensamentos, imagens, lembranças, etc.) que devem ser considerados também como “objetos” em relação a verdadeira consciência. Por tanto, mesmo estes conteúdos psíquicos devem ser afastados e acalmados se nossa intenção é chegar a uma verdadeira interiorização e a uma abstração completa, que nos permitam tornar-nos sensíveis a realidade interior, tão viva e “substancial” quanto a exterior.
É claro que se faz necessário muito treino, exercícios e desenvolvimento de técnicas para superar a tendência a extroversão e o habito de viver superficialmente, além de ser preciso acalmar os contínuos movimentos das energias dos três veículos. Este conjunto de técnicas e de treinamentos constitui uma fase preparatória para a meditação propriamente dita, fase necessária que poderia ser chamada “fase psicológica”.
O processo meditativo, portanto, é subdividido em dois períodos chamados:
1 – Meditação concreta, psicológica (ou com semente)
Neste grupo incluem-se diversas técnicas que utilizam o ponto de apoio para manter a atenção. Entre esses pontos de apoio, incluem-se imagens, desenhos, que estão fisicamente diante do praticante ou intensamente mentalizados.
Ela desdobra-se em:
1. Meditação com apoio externo : símbolos físicos
2. Meditação com apoio interno : idéias
No decorrer do período ou fase de meditação psicológica deve-se procurar habituar os veículos pessoais a se tornarem calmos, receptivos, silenciosos e eliminar os obstáculos internos devidos as sensações, emoções e mobilidade excessiva da mente.
Esse trabalho de tranqüilização dos três veículos é chamado “alinhamento inferior” e constitui-se de três estágios:
a – relaxamento do corpo físico e concentração
b – tranqüilização do corpo emotivo ou astral
c – silencio e calma do corpo mental
O relaxamento do corpo físico serve para preparar e favorecer a calma interior e sobretudo a emotiva que esta estritamente relacionada com a distensão e a tranqüilidade do corpo físico; além disso, é sua função permitir e nós mesmos esquecermos as sensações corpóreas.
Há inúmeras técnicas para a obtenção de um bom relaxamento do corpo. Entre elas a que estamos aplicando no nosso trabalho.
A concentração que encontra-se junto com o relaxamento surge concomitantemente com este e vira a possibilitar uma interiorização uma vez que sem esta qualidade é nos difícil “olharmos” para o nosso interior uma vez que o externo exerce uma maior influencia.
Existem também inúmeras técnicas para o treino da mesma algumas das quais lhes ensinamos.
A tranqüilização emotiva, caso não tenha sido alcançada juntamente com o relaxamento físico, pode ser obtida com varias técnicas entre as quais a visualização de imagens que inspirem calma, serenidade, paz, pois a energia que compõe o corpo emotivo é extremamente sensível as imagens. Também pode ser obtida com a repetição o de palavras ou frases estimulo que surgiram a paz, a estabilidade a calma, etc.
Para podermos atingir este nível de tranqüilização e posterior desidentificação devemos antes “ordenar” o corpo emotivo através da eliminação de muitos bloqueios que existem nele que são decorrentes da nossa vida presente. Isto pode ser feito através de muitas técnicas entre elas a regressão consciente que da condições da realização desta etapa do trabalho.
No que diz respeito ao silencio e a calma mentais, o trabalho é extremamente mais complexo e quase sempre requer treinamentos e exercícios de vários tipos, que devem ser praticados por um período de tempo relativamente longo.
Conforme já ensinamos, o corpo mental tem uma função muito importante na meditação devido a sua natureza “dual”. De fato, é o único veiculo da personalidade que participa ao mesmo tempo da personalidade e do mundo do Eu Superior. O corpo mental está subdividido numa parte inferior, ou concreta, que se apresenta antes do pensamento racional lógico, discursivo, e numa parte superior, que se apresenta antes do pensamento intuitivo, abstrato, criativo, impessoal, que já pertence a dimensão espiritual do Eu Superior, como já sabemos.
Para alcançar esse resultado, devemos passar por uma fase de exercícios de concentração mental (dharana), ainda mais profunda do que a inicial, através dos quais poderemos desenvolver o poder do pensamento concentrado e focalizado, obediente a vontade do Eu Superior; e depois por uma fase de meditação com semente (dhyana) no decorrer do qual se desenvolve a capacidade reflexiva da mente, e o poder de aprofundar um conceito, uma idéia, até alcançar seu significado simbólico e universal.
De acordo com Patanjali, a concentração mental e a meditação com semente constituem-se de sete estágios:
1 – Escolha do objeto sobre o qual concentrar-se.
2 – O retrair-se da consciência mental do mundo externo, de forma que os meios de percepção e de experiência (os cinco sentidos) sejam acalmados e a consciência não se volte mais para o exterior.
3 – A Consciência se concentra e se fixa na cabeça.
4 – A mente se fixa e a atenção volta-se exclusivamente para o objeto escolhido.
5 – A visualização ou percepção imaginativa deste objeto e o raciocínio lógico sobre ele.
6 – A extensão dos conceitos que foram formulados, passando do especifico e determinado para o geral, universal e cósmico.
7 – Procurar chegar aquilo que está por trás da forma escolhida como objeto de concentração, isto é, checar a idéias que a produziu.
Este procedimento eleva gradativamente a consciência e permite ao aspirante transferir-se do lado forma para o lado vida da manifestação.
A concentração é a fase preparatória da meditação com semente. A diferença está não na técnica, mas na qualidade do sujeito escolhido para a concentração.
Do exame deste tipo de treinamento, resulta, claramente que a concentração mental, qualquer que seja o objeto escolhido, é a preparação para a meditação propriamente dita, mesmo a de caráter “reflexivo” cuja finalidade é criar a ponte mental entre a personalidade e o Si.
A meditação psicológica, portanto, é uma preparação dos veículos inferiores para o silencio e a calma, e poderia mesmo ser chamado de “meditação com semente”. De fato, quando usamos a mente para refletir e meditar sobre um determinado pensamento, isso leva gradualmente a superar a própria mente e o nível racional e a entrar em um estado de consciência livre de conteúdos, calmo, silencioso, desidentificado do intelecto mas, ao mesmo tempo, atento e desperto.
Sri Aurobindo afirma: “É uma concentração que procede através da idéia e utiliza o pensamento , forma e o nome como chaves que abrem as portas da Verdade escondida atrás de cada pensamento, cada forma, cada nome, para a mente concentrada; isso porque através da idéia o Ser mental eleva-se, além de qualquer expressão, para Aquele que é expresso, do qual a idéia é somente um instrumento”.
Portanto, pouco a pouco, exatamente através do uso consciente e voluntário da mente, é possível alcançar o superamento dela mesma e sua desidentificação, alcançando-se então um estado todo especial chamado por alguns estudiosos da meditação de “estado de atenção ativa”. Na realidade, esta é uma qualidade de atenção diferente, conforme afirma Corrado Penso num de seus escritos sobre a meditação que citamos a seguir:
“… a atenção comumente é passiva, ou seja, acende e apaga dependendo do interesse para com os objetos-eventos que aparecem a sua frente. Enquanto na “qualidade diferente de atenção”, isto é, na atenção ativa, o eixo desloca-se dos objetos-eventos para a atenção… Ficamos atentos ao estar atentos… A proposta da meditação é cultivar esta a atenção ou consciência não identificada com os conteúdos mentais, e, portanto, é profundamente diferente da consciência comumente entendida que consiste nesta identificação…”
A finalidade principal, então, na meditação psicológica, é conseguir acalmar os movimento dos veículos pessoais para desidentificar-se deles e atingir um estado de consciência livre e independente e um “fundo consciencial” que, mesmo vazio e sem conteúdos, tenha a qualidade da atenção atenta e consciente. É o que as doutrinas esotéricas chamam de “atitude do Espectador ou da Testemunha silenciosa”, que na realidade é um nível de consciência muito próximo da consciência do Eu Superior, digamos, um seu reflexo. Ele constitui uma importante meta alcançada, pois permite-nos ter o ponto de apoio necessário para poder dar inicio a uma meditação mais profunda e criativa.
A mente, que em geral constitui o maior obstáculo na fase de preparação ou alinhamento inferior, deve ser treinada para seguir direções bem precisas de pensamento, para concentrar-se numa idéia ou num objetivo precedentemente escolhido, para tornar-se obediente instrumento de conhecimento do Eu Superior, e revelar sua verdadeira natureza de interprete e esclarecedora.
Em geral, é preciso dedicar alguns meses a este tipo de meditação preparatória antes de poder passar para a segunda fase: meditação espiritual, que requer a capacidade de desidentificar-se facilmente e sem maiores esforços dos veículos pessoais, de entrar no silencio e de saber abrir-se a consciência e as energias do Eu Superior e utilizá-las para o própria transformação e para o trabalho.
Todo o nosso trabalho visa exatamente atingir esta condição.
A fase da meditação psicológica, pela qual estamos passando traz como resultado fundamental, o aparecimento de um centro de consciência desidentificado dos veículos pessoais, que não é somente um “fundo de consciência” vago e amorfo, mas revela-se a verdadeira dimensão humana, a realidade mais intima do homem, dotada de consciência e vontade. Em outras palavras, ao alcançar o estado de “atenção ativa” e a consciência sem conteúdos, manifesta-se o nosso verdadeiro Eu, o centro de autoconsciência que é o reflexo do Eu Superior, de forma espontânea e sem esforços.
O Eu Superior, mesmo sendo uma centelha da Essência Universal, ao encarnar manifestando-se e revestindo-se de veículos feitos de substancias energias cada vez mais densas, individualiza-se, isto é, tornar-se consciente de si mesmo como entidade autônoma e auto-evolvente, através de todo o processo evolutivo do homem.
O sentido do eu, a autoconsciência, é o reflexo dessa individualização gradual do Eu Superior, desse processo de auto-reconhecimento. Cada um de nós deve, pouco a pouco, enuclear em si mesmo este centro de autoconsciência autentica, o Eu Verdadeiro, a individualidade, que não é o eu psicológico, o Eu construído e egoistico, mas sim um núcleo de consciência livre,, autentico e estável, que reflete a natureza e a essência do Eu Superior.
Assim, a pergunta central que o homem faz a si mesmo ao despertar de sua inconsciência e começar a sentir a exigência de descobrir o significado da vida, é a seguinte: “Quem sou eu?”. Não é nada fácil responder a esta pergunta, e no entanto, se ela for colocada de forma correta e em atitude intensamente meditativa, pode tornar-se o meio catalisador da verdadeira autoconsciência. Narra-se, a respeito, que o grande Mestre indiano Ramana Maharshi, com apenas 17 anos, conseguiu a iluminação e teve a revelação do Eu Superior, exatamente quando fez a si mesmo esta pergunta, em um momento de intensa meditação e procura.
Por não termos, obviamente, o mesmo grau de maturidade de Ramana Maharshi, não poderemos obter um resultado tão rápido e elevado; poderemos porem, através de sucessivas desidentificações , conseguir libertar-nos daquilo que não é o eu e estabilizar-nos num centro de consciência livre e destacado que nos dará o sentido da estabilidade, da autoconsciência e da identidade.
Isto pode acontecer com a meditação psicológica quando praticada com seriedade e constância.
O centro de autoconsciência não é o Eu Superior total, mas uma projeção, um seu reflexo. Poderíamos defini-lo “aquele pouco de consciência do Eu Superior que conseguimos perceber, enquanto estamos, em parte, ainda limitados pela identificação com a personalidade”. Todavia, mesmo sendo tão somente o reflexo do Eu Superior o centro de autoconsciência possui qualidades e poderes bem definidos. A primeira destas qualidades é a consciência pura, isto é, livre e autentica, sem conteúdos, dotada de clareza, estabilidade e destaque.
A segunda é a capacidade de síntese própria do poder unificador do Eu Superior, que, por natureza, sempre tende a unidade, a totalidade, a harmonia. De fato, o centro de autoconsciência é chamado também centro unificador da personalidade, pois tem a função de integrar, harmonizar e coordenar os três veículos entre si.
Podemos, portanto, verificar o grau de aproximação do eu superficial ao Eu Superior exatamente com base em seu grau de estabilidade, de capacidade de síntese, de harmonia e de unificação dos conteúdos pessoais.
Outro dos poderes fundamentais do centro de autoconsciência é a vontade, não como é comumente entendida, mas como uma força interior, um poder de direção e de controle, uma capacidade de vislumbrar a meta, uma nascente de energias livres e dinâmicas. Em outras palavras, a vontade entendida como uma “presença” central, uma força que sabe o que quer e pode realiza-lo.
Então, os três poderes fundamentais do centro de autoconsciência são: a consciência (ou consciência do Eu Superior), a capacidade de síntese e a vontade.
Reencontrar esse centro é uma passagem obrigatória, antes de despertar do Eu Superior. Ou melhor, poderíamos dizer que constitui a porta através da qual teremos de passar para reencontrar a totalidade do Eu Superior, nosso verdadeiro Ser. O sentido do eu, de fato, é o que nos permite fazer a experiência determinante de nosso desenvolvimento interior da solidão, da autonomia e da liberdade de sustentações e projeções. Esta experiência nos permitira encontrar a nascente de nossa força interior e descobrir Deus no profundo de nós mesmos.
Alan W. Watts escreve:
“Enquanto o homem moderno não tiver realmente entendido o significado de seu evidente divorcio da natureza, de seu agudo senso de separação e identidade pessoal, não poderá absolutamente entender que seu verdadeiro Eu Superior é Deus. Se ele tentar impor-se este ensinamento é mais do que provável que sofrera um acréscimo espiritual, uma dilatação de seu eu para a dimensão de Deus… Isso acontece porque a desafortunada vitima não aceitou a divisão e o conflito. Não permitiu a Deus ser um eu. Negou aquilo que a natureza predeterminou ao desenvolver o sentido de separação e, enquanto não o tiver aceito, todas as suas tentativas de resolver o problema serão tentativas em termos de egoísmo. Em outras palavras, tudo o que a solidão e o isolamento da autoconsciência comportam, toda tentativa de se sair será inútil. O Eu não pode abolir a pena do conflito entre si e o universo com a simples tentativa de se identificar com a essência daquele universo que é Deus. Paradoxalmente deve realizar sua união com Deus sendo um eu. Antes de poder unir você deve dividir.”
Meditação Pratica 1 – Relaxamento