Vamos apresentar agora, da melhor maneira possível, as bases filosófico espirituais que norteiam a pratica do Tai Chi Chuan.
Para iniciarmos está proposta se faz necessário, primeiramente, estabelecermos alguns conceitos que são de suma importância para a compreensão do tema tratado.
Devemos explicar a maneira de pensar do Oriental, que é diferente, como veremos, da maneira de pensar do Ocidental. Enquanto o pensamento ocidental move-se em linha reta para o objetivo do pensamento ou contemplação, partindo de um ponto de vista particular, o modo oriental de pensar consiste mais em circular o objeto de contemplação. O “ataque frontal” ocidental leva a um resultado mais rápido e inambiguo; mas ele o é tão inambiguo quanto unilateral. Neste sentido, o método oriental ganha do ocidental por meio de um “ataque concêntrico” e constantemente renovado, movendo-se em círculos sempre menores até o objeto, gerando uma impressão multilateral, multidimensional, formada da soma ou de superposições integradas de impressões isoladas dos diferentes pontos de vista até que no último estágio desta aproximação concêntrica o experimentador tornar-se-ia uno com o objeto de contemplação.
Este modo de pensar não trata de fixar a mente de acordo com o sistema ocidental, que é fixo, inorgânico e no qual dois postulados opostos não podem ser verdadeiros ao mesmo tempo, mas manter a mente em movimento como algo vivo, orgânico, o que realmente é, isto é, mudar o ponto de vista deixando-a circular o objeto contemplado.
Para que fique mais claro o exposto apresentamos aqui as quatro posições da lógica oriental:
1 – é
2 – não é
3 – é e não é
4 – nem é nem não é
Em outras palavras as quatro afirmativas postulam:
1 – Ser (ou “existência” do objeto)
2 – Não Ser
3 – Ser como também não ser
4 – Nem Ser e Nem Não Ser
As duas primeiras afirmativas se referem ao reino dos objetos concretos, perceptíveis pelos sentidos ou através de conceitos, o reino de entidades fixas, onde podemos falar de identidade ou não identidade. Em resumo o reino material.
A terceira afirmativa refere-se ao reino da relatividade e corresponde ao estágio dos eventos orgânicos vivos. A quarta, refere-se ao reino da experiência transcendental, excedendo a percepção sensorial e conceitos, porque seus objetos são infinitos e somente acessíveis a intuição, isto é, a experiência direta ou a experiência de dimensões mais elevadas. Assim a terceira e quarta afirmativas são vivas, dinâmicas, espirituais.
Só podemos entender do mundo aquilo que desenvolvemos e vivenciamos no nosso interior.
A maneira de pensar do ocidental atual tem sua “origem” em torno de 1500 pois que antes desta data a visão do mundo dominante na Europa assim como na maioria das outras civilizações, e as orientais se incluem ai, era orgânica. As pessoas viviam em comunidades pequenas e coesas, e vivenciavam a natureza em termos de relações orgânicas, caracterizadas pela interdependência dos fenômenos espirituais e materiais e pela subordinação das necessidades individuais as da comunidade.
A visão orgânica, acima mencionada, é aquela que entende que os sistemas vivos são orgânicos ou melhor organizados de tal modo que formam estruturas de múltiplos níveis, cada nível dividido em subsistemas, sendo cada um deles um “todo” em relação a suas partes, em uma “parte” relativamente a “todos” maiores. Assim, as moléculas combinam-se para formar as células. As células formam tecidos e órgãos, os quais formam sistemas maiores, como o aparelho digestivo ou o sistema nervoso. Estes, finalmente, combinam-se para formar a mulher ou o homem vivos; e a “ordem” estratificada não termina ai, As pessoas formam famílias, tribos, sociedades, nações. Todas essas entidades – das moléculas aos seres humanos destes aos sistemas sociais – podem ser considerados “todos” no sentido de serem estruturas integradas, e também “partes” de “todos” maiores, em níveis superiores de complexidade. De fato, vemos que “partes” e “todos num sentido absoluto, não existem
A estrutura científica dessa visão de mundo orgânico assentava em duas autoridades: Platão e a Igreja, a principal finalidade da ciência daquela época era compreender o significado das coisas e viver de acordo com elas em Harmonia e não exercer a predição ou o controle de maneira agressiva e violenta além de Desarmônica.
Esta visão mudou radicalmente nos séculos XVI e XVII. A noção de um universo orgânico, vivo e espiritual foi substituída pela noção do mundo como se ele fosse ma maquina e portanto algo inorgânico, morto e sem espírito, e a maquina do mundo converteu-se na metáfora dominante da era moderna.
Ora, esta maneira de ver teve seu tempo e foi muito útil a humanidade porque lhe permitiu entender muitos fenômenos e muita coisa sobre o homem mesmo. Entretanto esta visão fez com que o homem, com o passar do tempo perdesse a noção ou deixasse de entender o que significa vida algo dinâmico e inter relacionado. Tal posição gerou um desequilíbrio no homem e por decorrência na humanidade. É o que vemos e vivemos agora.
Bem, após conhecermos a visão oriental, orgânica e a atual visão ocidental inorgânica vejamos a aplicação da visão oriental através das Artes Marciais.
Para o Ocidente, quando não a encaramos sob o aspecto atual, a China muitas vezes, e apenas o Império do Meio, dos letrados, dos calígrafos, que buscavam o refinamento em todas as circunstâncias. A China foi constantemente ameaçada por guerras, tanto de fronteiras quanto internas, e como consequência desenvolveu vigorosa tradição de autodefesa. Deixar isso de lado seria esquecer a realidade de um povo numeroso e essencialmente rural. Dai que as artes militares desempenhassem sempre um papel importante na civilização chinesa, cujo ideal, aliás, era o equilíbrio entre as virtudes civis e militares.
O Tai Chi é uma dessas técnicas de autodefesa.
Na tradição chinesa, a força guerreira destina-se menos a atacar do que a defender e a instaurar a “GRANDE PAZ” (Taiping).
Esta “GRANDE PAZ” nada mais é do que a visão orgânica do mundo em aplicação, isto porque ela não é só paz de natureza externa, mas principalmente de natureza INTERNA pois que um indivíduo (parte) em paz consigo mesmo, sem duvida nenhuma esta em paz com tudo (todo) o que o cerca. Ai está pois a base filosófica das Artes Marciais, o Kung Fu entre elas, a PAZ INTERIOR.
Precisamente por isso, e dentro da filosofia do Tai Chi, a busca da verdade existencial, o respeito aos demais, a vida, a humildade, o respeito a morte, a sinceridade e a ausência de violência, sempre que seja possível, são os eixos motores na conduta do praticante destas belas disciplinas.